Há dias, num comentário no facebook, alguém jovem disse que até gostava do sistema capitalista, mas que era um sistema que não era justo porque não recompensava o mérito. A observação é pertinente e inteligente, mas falta-lhe mais informação.
Contextualizando, o comentário foi feito no meio de críticas ao capitalismo, observações de que o capitalismo tinha "falido" (feitas pela mesma pessoa) e por causa de alguém que colocou uma citação antiquada do Saramago, que dizia que os problemas actuais (da Humanidade, das pessoas) tinham a ver com o desenvolvimento tecnológico, falta de comunicação e individualismo.
Debruçando-me só sobre o comentário, nada é mais falso, assim dito. Mas nada é mais verdadeiro, se o aplicarmos ao "capitalismo à portuguesa". As gerações mais jovens não têm noção de que o que temos não é capitalismo, propriamente dito, ou se quisermos, é só um tipo distorcido de capitalismo, construído pela sociedade do pós-25 de Abril. O sistema, em Portugal, não é carne nem é peixe. É um sistema de inspiração capitalista, sem dúvida, mas demasiado regulado, com demasiadas leis e com demasiada influência dos governos, do poder e dos lobbies políticos, na economia. E esta regulamentação e influência, em Portugal e noutros países da Europa altera completamente o funcionamento normal do sistema, criando permanentes "fogos" a que alguém (dos lobbies políticos) acha por bem acudir, conforme os seus interesses políticos (ou económicos escondidos) e não consoante o interesse das pessoas, do mercado e da economia.
Esta interferência de grupos políticos, que gostam de ter este poder acrescido, em nome da redistribuição de riqueza e da compensação dos problemas das camadas mais desfavorecidas, na minha opinião é demasiado profunda e altera, dessa forma, as motivações económicas das pessoas, que fazem parte da sociedade e da economia. A alteração das motivações altera o funcionamento do sistema, alterando os seus resultados. As pessoas, acham que mais vale cair em graça do que conseguir ser engraçado. Alguém, sempre, ocorre para compensar o que for necessário (As Câmaras, o Governo, seja quem for, tem que compreende que corre mal).
Acresce que esta intervenção excessiva do estado na economia é feita com o dinheiro dos impostos, em excesso também, de todos e, como mesmo assim nunca chega, com dinheiro emprestado dos estrangeiros, que poupam o que nós já não poupamos e emprestam-nos as suas poupanças, com juros. E assim foi aumentando, sempre e sempre, a dívida pública. Este sistema, que não é o sistema capitalista e não compensa, de facto o mérito. E isso altera tudo.
Um sistema capitalista compensa o mérito. Um sistema democrático proporciona que todos, e não só elites de poder ou aristocráticas, possam ter mérito e possam obter recompensas satisfatórias, para si e para as suas famílias. É um sistema mais justo, que recompensa quem consegue chegar mais longe, quem consegue merecer, quem se esforça, quem vê onde os outros não vêem, quem faz mais, onde os outros não fazem, etc. No entanto, ninguém disse que um sistema justo tem que ser equilibrado. Ou disse? Esta justiça do mérito, mesmo democrática, deixa muita gente de fora, muita gente que não consegue ter mérito suficiente, mesmo quando se esforça, ou não se esforça, mas não consegue chegar. Cria, no entanto, mais riqueza e, com isso, mais desiquilíbrio. Mesmo que todos tenham mais, há sempre uma pequena maioria que tem mais que os outros todos.
O que conta? Todos terem mais, mesmo com desiquilíbrios, ou todos terem menos e estarem mais equilibrados???? Esta é a velha história de saber se as pessoas querem ganhar mais, mesmo que os vizinhos ganhem ainda mais do que elas ficando a ganhar em poder de compra mas, aparentemente, talvez perdendo em status (por comparação), ou se preferem não ganhar mais, desde que os vizinhos ganhem menos do que elas perdendo em poder de compra mas ganhando em status (?). Ficar pior ou igual, mas melhor que o vizinho, por comparação, vale mais do que estarem todos melhores mas o vizinho estar ainda melhor? Aparentemente há muitas pessoas que escolhem a opção de ficarem piores, desde que quem as rodeia não fique melhor do que elas: preferem as aparências e o status mais elevado (por comparação com os outros que os rodeiam) a ficar, de facto, melhor financeiramente. São, talvez, reflexos da inveja social. Mas nem todos são assim. Muitos preferem, de certeza, a sua realização pessoal, independentemente dos outros.
Em Portugal continuamos pobrezinhos mas honrados, continuamos humildes com a mania das grandezas, e naifs o suficiente para pensar que somos todos iguais. E somos, sim ... Mas uns ... São mais iguais que outros!!!! Agora temos um problema grave: não há dinheiro para pedir a um ceguinho para cantar, no metro, não há dinheiro para igualdades e as pessoas não têm poupanças, para os tempos difíceis, não vão ter quem as acuda enfim, não estão preparadas para o nível de sofrimento social que aí vem. É uma pena.